sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Conto da vida real


A Clínica de Medicina Geral Amarante era o maior centro de referência em saude de toda a cidade. Seu fundador e proprietário, o Dr. Roberto Amarante, era um cardiologista renomado em todo o estado, não só pela atuação como médico, com destaque para as consultas grátis ao fim do dia destinadas às pessoas carentes, mas também por ter ingressado na carreira política, sendo prefeito de seu município em duas oportunidades.
Dr. Roberto pedia que sua secretária marcasse todas as suas consultas a partir das oito horas da manhã, no entanto, o costume de acordar cedo ficara no passado e todos os dias o médico chegava ao consultório com uma hora de atraso. Outra característica da qual o homem dispunha, era a simpatia:
                - Bom dia, Seu Francisco! Como vai a família?
                - Bem.
                - Que bom!
Não havia um dia sequer em que o homem deixasse de trocar algumas palavras com Seu Francisco, o operador do elevador e um dos funcionários mais antigos da clínica. Nos poucos segundos que lá permanecia, munido de seu jornal, no qual lia apenas as manchetes naquele curto espaço de tempo, se preocupava sempre  em saudar seu empregado.
Seu Francisco há algum tempo vinha passando dificuldades financeiras. Sua esposa havia sido despedida do emprego e seu único filho, que ajudava os pais nas dispesas da casa, acabara de casar às pressas por conta de uma gravidez inesperada da sua companheira. Por vezes o almoço na casa do velho Chico era apenas arroz e o feijão que sobrou do outro dia. Carne só era encontrada no seu prato, quando algum vizinho, comovido com a situação, compartilhava algum pedaço que sobrara na panela.
Em um dia de trabalho, aparentemente como outro qualquer, lá estava Seu Francisco operando o elevador. Já passavam das nove horas e nem sinal do Dr. Roberto, seus atrasos eram normais, mas nunca demorara tanto. Eis que finalmente o médico surge na porta de entrada da clínica, andando a passos rápidos, como que ciente do problema que estava prestes a enfrentar por conta dos minutos a mais na cama. Apesar da pressa, Dr. Roberto seguiu o ritual e cumprimentou o funcionário:

- Bom dia, Seu Francisco! Como vai a família?
                Em todos aqueles anos em que trabalhara na clínica, Seu Francisco sempre respondera ao patrão da mesma forma, com um sonoro “bem”. Mas, aquela ocasião despertou nele uma vontade de expor a alguém a situação difícil que vinha passando, não no intuito de gerar no seu patrão um sentimento de piedade e posteriormente uma ajuda financeira, mas sim de expurgar de si toda a angústia que era corriqueira nos últimos dias. Hesitou por um instante, até que, com a voz titubeante, respondeu:
                - Mal.
                Tão logo fechou a boca, ouviu do Dr. Roberto a seguinte resposta:
                - Que bom!
                A porta do elevador se abriu no andar em que ficava o consultório do médico e ele seguiu seu caminho, lendo o jornal, e sem pronunciar nenhuma outra palavra, como sempre fazia todas as manhãs.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

White Flag


Devaneios entre realidade
E uma vida de fantasia.
“Aqui tudo é perfeito”,
Diz o slogan da facemania.
“Curta e baixe for free”,
Underground versus pirataria.
Propaganda política é permitido,
Censura, só se for putaria.
Falar de Deus é bem-vindo,
Ateísmo? É coisa do cão, Ave Maria!
Compartilhar é exercer seu direito,
Ganhar um “curtir” é regalia.
Clarice Lispector, Caio Fernando Abreu,
Sinônimo de indireta em forma de poesia.
Nada de USA ou URSS,
O que se vê hoje em dia,
É gente usando internet
Pra brincar de guerra fria.

Hômi, eu quero é paz!

sábado, 18 de agosto de 2012

Tudo que escrevi dormindo


Aprendi a ignorar,
Calei-me para teus atos,
Olhos fechados pra não ver teu rumo,
Que contraste, enfim te vi voar.

Subiu bem alto, beija-flor.
Em seu voo ímpar, parou no ar.
Tocou as nuvens,
Contemplou os girassóis.

Quis me dar suas asas...
Para que eu também pudesse voar.
Mas sou só um ser humano, passarinho.
Terra firme é o meu lugar.

Também já alcei meus voos.
Compartilhei o céu contigo,
Mas sempre retorno à realidade,
Logo que ouço um singelo “não”.

Teu voo é nato-natural, passarinho.
Vives nas alturas e só visitas o chão.
E quanto a mim, posso até voar.
Mas não passo de um piloto de avião.


sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Em tempos de Olimpíadas


As Olimpíadas da floresta estavam prestes a começar. Pela primeira vez seria disputada a prova de maratona e essa era, sem dúvida, a modalidade mais esperada por todos. Entre os principais favoritos estavam o macaco, conhecido pela sua esperteza bem ao estilo “malandrão”, e o coelho, detentor de uma velocidade invejável.
Dias antes da prova, os animais começaram a treinar para a corrida, cada um a seu estilo. O macaco, confiante nas suas capacidades físicas, enfiou a cara nos livros e começou a estudar técnicas de corrida que pudessem melhorar seu desempenho, bem como as características da pista e tudo mais que pudesse fazer diferença na hora decisiva, além de gastar várias horas conversando com o sábio leão, que lhe dava várias dicas sobre o esporte. O coelho, por sua vez, achou que seria melhor partir direto para prática e corria todos as tardes pelo bosque, a princípio de forma intervalada, mas com o passar do tempo já estava completamente adaptado e agora passava a marcar o tempo que, à propósito, diminuía à cada treino, levava para completar todo o percurso.
Chegou o dia tão esperado, e ao contrário do que havia sido estipulado anteriormente, a corrida não seria mais nos campos do sul, mas sim no outro extremo da floresta: o norte. A mudança não assustou o macaco, que por ter estudado bastante conhecia muito bem qualquer pista que escolhessem, e logo que foi dada a largada ele disparou na frente dos demais concorrentes, seguido de perto pelo coelho, confirmando assim o favoritismo que lhes foi concedido. Mas bastaram 3 minutos de corrida intensa e o macaco começou a mostrar sinais de cansaço, sentia um desconforto na região abdominal que logo lhe fez parar no meio do caminho. Era a famosa pontada no flanco, mais conhecida como “dor desviada”, sobre a qual o leão havia lhe falado, mas a qual ele não deu tanta atenção. Melhor para o coelho, que sem o maior rival para ameaçar sua vitória, assumiu a liderança da prova e seguia em ritmo acelerado rumo à medalha de ouro, quando caiu repentinamente e começou a gritar de dor. O animal havia pisado em um buraco que estava coberto por plantas e por não ter estudado o percurso antes da corrida, não sabia da sua existência.
Enquanto isso, o elefante, o último na lista de apostas para ganhar a competição por ser o mais pesado dos competidores, correu o tempo inteiro em ritmo cadenciado como fez nos seus treinos, desviou de cada obstáculo cuidadosamente lembrando do que havia lido nos livros, usou devidamente as técnicas de respiração que aprendera com o leão e, no auge da sua humildade, ainda parou na reta final da prova para socorrer o coelho, antes de seguir para o pódio e receber a premiação.

Vivendo em BABYL(on)AND


Aprender pra não errar,
Ou errar pra aprender?
Uma hora a Babilônia vai te confundir.
Mesmo sem ter respostas,
Seja humilde pra ouvir,
E audacioso pra tentar.
É necessário aprender sobre a vida,
Mas também é preciso viver.

Equilibri-se!

(A Babilônia vai te confundir,
Sim, ela só quer te confundir).