Um
tribunal é o cenário do fato que vos conto. No banco dos réus, tenso e
apreensivo, estava João Batista, vulgo “João de Deus”, homem honesto, trabalhador,
casado e pai de duas crianças. De origem humilde E honrada, João de Deus sempre foi um exemplo de cidadão, mesmo em
meio à criminalidade do bairro onde vivia com a família nunca desrespeitou as
leis, exceto em um ponto, justamente aquele que o levara até a prisão.
Eram
tempos difíceis, em que João de Deus precisava desempenhar seu ofício de
pedreiro desde as primeiras horas do dia, com o sol ainda por nascer, até às
nove horas da noite. Tudo para garantir o alimento da esposa e dos filhos, que
muitas vezes já estavam dormindo e nem o viam chegar em casa. A rotina era
exaustiva e o homem precisava de um subterfúgio, o qual sabia muito bem onde e
como encontrar.
Em
uma sexta-feira após o término do expediente, João de Deus nem sequer conversou
por alguns minutos com os colegas, como era de costume. Simplesmente pegou sua
bicicleta e saiu às pressas sem dizer a ninguém que rumo tomaria. Horas depois
os companheiros do rapaz descobriram, pela movimentação que havia em sua casa,
que ele acabara de ser preso em uma ação da polícia militar para apreensão de
drogas em uma boca de fumo próxima. João, que lá tinha ido em busca da “erva
proibida”, comprava a droga justo no momento em que os policiais tomaram a boca
e deram voz de prisão à todos os presentes, sob acusação de tráfico.
Ainda
no tribunal, estava também Roberto Goulart, o advogado que a defensoria pública
indicara para assumir a defesa de João. Roberto era, em um passado não muito
distante, um garoto de futuro promissor na carreira de advocacia, oriundo de
uma família nobre e influente. No entanto, a pressão sofrida pelos pais e
parentes visando seu crescimento profissional foi demais para o rapaz, que
assim como João, também buscara nas drogas (nesse caso, em pó) uma saída para
seus problemas. O que a princípio era mera fuga da realidade acabou por se tornar
uma dependência, e após duas internações, Roberto tentava se reestabelecer
tanto no âmbito psicológico como profissionalmente e uma vitória nessa causa
seria uma espécie de alavanca para o sucesso novamente.
Do
“outro lado da moeda” estava Jairo Sampaio, promotor conceituado e famoso por
colocar os bandidos, segundo ele, “no lugar onde se deve”. Com a popularidade
em alta, pensava em se candidatar a algum cargo público em breve e já começava
a fazer sua política de governo. Estava decidido a incriminar João de qualquer
forma e somar mais um “marginal” preso à sua lista. João, usuário de
entorpecente desde a adolescência, não conseguia mais se satisfazer com uma
quantidade pequena de droga e por isso comprara-a em uma grande escala. Mal
sabia ele que aquela erva adquirida com o simples propósito de aliviar a
tensão, seria agora o motivo da sua desgraça, já que Jairo conseguiu convencer
o juiz de que a quantidade de maconha portada pelo pedreiro era superior ao
tolerável para consumo.
Ao
fim do julgamento, João de Deus, tomado pelas lágrimas, teve direito apenas de
se despedir brevemente da esposa e filhos para em seguida voltar ao presídio,
sua casa pelos próximos cinco anos, onde pagaria caro por um crime do qual não
era inocente, mas também não tão culpado. Roberto, por sua vez, amargurava mais
uma derrota na vida e o medo das consequências que isso podia acarretar com a
iminente volta da sua dependência química.
Quanto
a Jairo Sampaio, sorridente e provando da sensação do dever cumprido, só lhe restava
comemorar o sucesso profissional e a ascensão popular que em pouco tempo lhe
garantiria um cargo político. Avisou a esposa que chegaria tarde em casa por
conta de uma reunião que teria com membros do partido, em seguida ligou para
Camila, sua amante há 2 anos. Os dois comeram, beberam, riram, até que encerraram
a comemoração por mais uma vitória do bem-sucedido promotor, com uma bela noite
de amor.
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